
Carlos Aznárez
Os apuros do presidente Juan Manuel Santos para que nos últimos dias
de março se assine a paz com a delegação das FARC-EP em Havana, não
condiz com a realidade que todos os dias é mostrada no território. A
violência contra os movimentos populares subsiste e é letal. Também, é
claro, arremete tanto contra os guerrilheiros das FARC, apesar do
cessar-fogo, e contra os do ELN, a quem é negada a possibilidade de
dialogar.
É verdade que a grande maioria da população quer que a guerra se
acabe, que os quatro milhões de deslocados regressem a suas casas, as
quais tiveram que abandonar aterrorizados pela ação do Exército e do
paramilitarismo. É certo também que como sequelas desta guerra de mais
de meio século, na qual a burguesia colombiana atiçou o fogo para não
perder nem um hectare de seus latifúndios e nem uma só de suas
milionárias propriedades, muitos cidadãos foram assassinados,
torturados, encarcerados (mais de 9.500 ainda permanecem na prisão) e
que essa é uma razão muito boa para que as armas de um e outro lado
cessem o fogo. Porém, o grande problema deste e de qualquer processo de
paz, passa por conseguir que se converta em uma mesa de negociações as
condições de pobreza, desocupação e repressão que durante décadas foram
descarregadas contra o povo colombiano. Por essa e não por outra razão,
muitos camponeses e camponesas, estudantes e operários tomaram a decisão
de se levantarem em armas.
De tudo isso sabe e sofreu a grande maioria dos combatentes das FARC
que hoje discutem com os homens do governo de Santos, inclusive com
alguns soldados que foram seus principais perseguidores e executores de
alguns de seus companheiros assassinados.
Em todo este processo, a guerrilha foi clara em suas expressões desde
que, pela primeira vez, se sentou à mesa em Havana. Disseram seus
comandantes: “Não viemos até aqui para nos render nem para ir à prisão”,
“queremos uma Colômbia em paz e com justiça social”. E esta última
reivindicação abre obrigatoriamente para outros apoiadores, que têm
relação com que não pode existir paz caso persista o paramilitarismo.
É nesse preciso ponto da questão que se está agora. Assim expressaram
recentemente os porta-vozes da insurgência, entre eles o comandante
Pablo Catatumbo, quando percebeu o perigo que significaria em um futuro
imediato a subsistência de bolsões de paramilitares assediando não só
eventuais combatentes desarmados, mas também, como agora mesmo acontece,
ameaçando de morte e em muitos casos assassinando lutadores dos
movimentos sociais e populares.
“É preciso desmontar o paramilitarismo caso queiramos chegar ao final
do conflito”, defende Catatumbo e, certamente, recorda todos os
sofrimentos vividos por gerações anteriores de lutadores. Por exemplo,
os da União Patriótica, quando em 1985, devido à persistência de
estruturas paramilitares protegidas pelo Exército colombiano, foram
assassinados dois candidatos presidenciais, os advogados Jaime Pardo
Leal e Bernardo Jaramillo, 8 congressistas, 13 deputados, 70 vereadores,
11 prefeitos e algo em torno de 5.000 de seus militantes.
No entanto, não é necessário ir tão longe no tempo. Agora mesmo, em
meio às expectativas de esperança provocadas na população pela
possibilidade concreta de um acordo de paz, existem territórios do país
que sofrem o assédio paramilitar de maneira virulenta. Ali estão os
habitantes do município de El Bagre, em Antioquia, que por estes dias
denunciaram a remoção forçada e massiva de dez comunidades, ou seja: 125
famílias, 580 pessoas, em sua maioria meninos e meninas. Também
reportaram a paralisação do comercio na zona, afetando a entrada de
alimentos para os povoados.
Só no mês de dezembro foram assassinados nessa zona cinco camponeses e
no de janeiro já se computam duas novas mortes de lavradores. Além
disso, grupos paramilitares portando importante quantidade de armamento
sequestraram por mais de 20 horas os habitantes de El Coral, também no
município de El Bagre.
Obviamente as FARC estão denunciando, mais uma vez, na mesa de Havana
estes graves eventos, porém se chegou a uma instância, na qual tanto o
governo colombiano como aqueles que atuam como garantidores neste
processo devem noticiar que nenhuma guerrilha pode pensar em desarmar-se
enquanto subsistam no território grupos perfeitamente identificados
(Aguilas Negras, Autodefensas Gaitanistas e outros), que permanecem
ameaçando com terror e matando populações indefesas. Em outras palavras,
assim expressam os próprios guerrilheiros do Bloco Magdalena Medio das
FARC: “O Governo e seus porta-vozes na Mesa de Diálogo devem entender
que não será possível ocorrer a transformação de uma organização armada
em movimento político aberto para debater nas praças públicas, ideias e
visões de país, sem armas, se não se desmontar o paramilitarismo de
Estado disfarçado em grupo criminoso”.
É algo puramente lógico, porém também é um grito de atenção ao mundo
para que se faça eco sobre a necessidade de pressionar o Estado
colombiano e seus aparatos militares (geralmente os protetores destes
grupos ilegais armados), para que tomem posicionamentos sobre o assunto.
A paz é possível sim. Porém, se não são colocadas em marcha medidas que
assegurem a partilha da riqueza para os mais necessitados, que a
riquíssima burguesia colombiana ceda parte do que acumulou durante anos a
custa de maus tratos e milhares de mortos, e por último, que nenhum
colombiano possa matar outro por discordar de suas ideias, como hoje
continuam fazendo, a paz se converteria somente em uma miragem.
Fonte: http://www.resumenlatinoamericano.org/2016/01/26/colombia-la-paz-es-posible-pero-por-carlos-aznarez/
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)